Todos temos hábitos, alguns adquiridos na infância e abandonados para o bem da convivência em sociedade. É normal um bebê soltar pum em público, mas depois de crescido ele aprende que isso não convém, principalmente em um local fechado e apinhado como um avião. Mas em todo voo tem sempre alguém que se esquece de desligar o celular, além do hábito pueril.
Mas não é de hábitos fisiológicos que pretendo falar, e nem daqueles que viram um tique. Há, por exemplo, fumantes que costumam bater o dedo na caneta na tentativa de livrá-la das cinzas. E fumantes que adquirem o hábito de colocar a caneta presa na orelha acabam se queimando. Outros hábitos são eventuais. Depois de dirigir por horas, tentei olhar no retrovisor quando quis ver quem vinha atrás. Mas aí eu estava caminhando.
Experimente alugar um carro em Londres para ver de quê o hábito é capaz. Na primeira esquina eu entrei numa avenida de quatro pistas, ampla o suficiente para dar meia volta antes de ser atingido pelos carros que vinham na contramão. Garotas que usaram o cabelo caindo nos olhos durante anos continuam jogando a cabeça para o lado mesmo depois de se livrarem da franja. E sofrem com a gozação dos que perguntam se aquilo é para fazer o cérebro pegar no tranco.
Quando adolescente passei a sacudir o pulso, movimento necessário para os relógios automáticos que surgiram para substituir os de corda. Nem preciso dizer que continuei sacudindo o pulso por um bom tempo depois de passar a usar relógios a pilha. Meus primeiros teclados de computador sofreram muito até eu perder o hábito de datilografar e adquirir o de digitar. Mas, por ter aprendido em pesadas máquinas de escrever, não consigo abandonar o hábito de descansar todos os dedos nas teclas, o que é impossível no minúsculo smartphone ou em qualquer teclado touch-screen inventado para quem "cata milho".
Quando aposentei a chave do portão da garagem de meu prédio, que exigia que eu abrisse o vidro do carro para alcançar a fechadura na parede, e passei a usar o controle remoto, levou um tempo até eu deixar de fazer as três coisas: abrir o vidro, pegar a chave e só depois o controle. É claro que o controle remoto também criou um hábito. Distraído, cheguei a apontá-lo para o nariz de um cobrador de cabine de pedágio, esperando que a cancela se abrisse.
Mas o hábito tecnológico mais recente tem a ver com meu iPhone, que uso há mais de um ano. A insensatez deste hábito eu só descobri há poucos dias, quando meu filho contou do problema enfrentado pelos inventores dos celulares touch-screen. A mesma tela acionada com o toque do dedo não poderia ser acionada pelo toque da orelha durante a ligação. Se isso ocorresse, a luz da tela permaneceria acesa revelando a cera de um ouvido ou saindo pelo outro, caso o usuário não tivesse nada na cabeça. A grande sacada foi fazer com que a tela se apagasse enquanto estivesse na orelha, e voltasse a acender quando afastada dali, para você poder encerrar a ligação ou usar outras funções.
A explicação de meu filho fez com que eu me sentisse um perfeito idiota por causa do hábito que venho praticando há mais de um ano ao encerrar cada ligação. Como hábitos são difíceis de serem abandonados, se você ligar para mim pode ter certeza de que meu iPhone será sacudido ao final da ligação. Eu sempre acreditei que a luz da tela só voltava à vida quando sacudida.
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Ah, Mário, vc é uma "figura", como se costuma dizer de pessoas notáveis!
ResponderExcluirEstou aqui rindo às lágrimas, ao imaginar o pobre do cobrador de pedágio perplexo olhando para o controle remoto apontado para seu nariz. Ô vida!! rsrsrs....