Quando eu era adolescente minha irmã começou a namorar um estudante de engenharia que agora é seu marido. Na época as coisas eram muito diferentes de agora, e menina de respeito nunca saía sozinha num carro com o namorado. No Brasil não dava nem para imitar filme americano de namoradinhos sozinhos num cinema Drive-In. Aqui não existia cinema Drive-In e quase ninguém tinha carro. No máximo o garoto convidava a garota para ir ao cinema convencional ver o último lançamento no Brasil do filme lançado dez anos antes em Hollywood.
Quando isso acontecia, o namorado era obrigado a morrer com um ingresso a mais, porque a menina não ia sem "vela", mesmo em cinema que tivesse lanterninha. "Vela" era o nome dado ao acompanhante, geralmente uma irmã mais nova, um irmão mais bobo, ou uma amiga mais encalhada. Existia também a versão "Psicose", de Hitchcock, quando a "vela" era a mãe da garota.
Nunca me esqueço dos quilômetros que rodei no banco de trás do "Corceu I" amarelo de meu futuro cunhado, sempre brigando com o sono. Afinal, minha mãe exigia uma vigilância cerrada dos pombinhos e me alertava para não aceitar suborno do tipo: "Você fica aqui comendo algodão doce enquanto nós vamos ali andar de Trem Fantasma". Nem pensar. Trem fantasma sem a minha presença no vagão de trás não ia rolar. Era muito escuro para ir sem "vela".
Naquele tempo ninguém falava em assédio sexual. Nem em Hollywood, onde as atrizes nos filmes apareciam vestidas do tornozelo ao chapéu, nem no trabalho, onde mulher chegava no máximo ao cargo de secretária, e mesmo assim vista com desconfiança pelas esposas que eram "do lar". Em Hollywood, a CIA só vigiava produtores, diretores e atores se fossem comunistas, porque todos sabiam que comunistas comiam criancinhas. Mas isso não tinha qualquer conotação pedófila. O que o pessoal do cinema fazia atrás da tela não ameaçava a segurança nacional, então a CIA nem se metia.
A expressão #MeToo, precedida do caractere cerquilha, também chamado de "cerquinha" ou "jogo da velha", só podia significar erro de datilografia. Ou era alguma garçonete da "Sunset Strip" dizendo "Me too!" porque topava participar como figurante em qualquer filme B, na esperança de ser a próxima Elizabeth Taylor de Marlon Brando. Atrizes que romperam o silêncio eram só as veteranas, por terem trabalhado antes no cinema mudo.
Os figurões de Hollywood daquela época só são lembrados hoje por terem colocado a mão no cimento fresco da calçada. Já os de hoje são lembrados por terem colocado a mão, porém não em cimento fresco. As mulheres decidiram romper o silêncio e contar o que acontece quando as câmeras olham para o outro lado. Enquanto aumenta o número de personagens de séries que vão sendo mortos para justificar sua ausência na próxima temporada, o mundo corporativo começa a se preparar para caminhar em terreno minado. Um artigo no New York Times diz:
"No Vale do Silício investidores têm se recusado a participar de reuniões com mulheres se ninguém mais estiver presente, ou mudam o local da reunião para um restaurante ou uma sala aberta. Executivos mais velhos de Wall Street procuram evitar reuniões a portas fechadas com mulheres jovens. E nas redes de TV alguns executivos do sexo masculino têm sido escrupulosos na escolha das palavras na hora de entrevistar candidatas a alguma vaga.".
Em outro artigo, no site "Medium", Anne Victoria Clark sugere adotar um procedimento que batizou de "The Rock Test", inspirado no ator de mesmo apelido, Dwayne “The Rock” Johnson, cuja estatura, musculatura e cara dura lembram o "Rochedo de Gibraltar". A ideia é conversar com qualquer mulher como se você estivesse conversando com o "The Rock", o que na gíria brasileira seria o equivalente a dizer que "mulher de amigo meu pra mim é homem". Se você tiver uma imaginação poderosa ao ponto de enxergar o "The Rock" do outro lado da mesa, eu duvido que sua interlocutora irá interpretar suas palavras como assédio.
A autora sugere também algumas situações, como quando uma colega de trabalho convida você para um café. Procure mentalizar que aquela escultura sensual, pertinho de você na pequeníssima e isolada copa da empresa, é o "The Rock" todo sujo, melado e fedido, depois de lutar com trinta bandidos. E tente se convencer de que ela poderia matar você ali mesmo, usando a colherinha como faca, o açúcar para asfixiá-lo ou o café quente para escaldar sua pele.
Um jantar de negócios a sós com alguma executiva levaria você a projetar nela a imagem do "The Rock" num tanque de piranhas, com sangue esguichando de todas as artérias. Se a sua imaginação for convincente, você acabará pedindo licença para ir vomitar no banheiro, mas nem pensará em encostar seu pé nas pernas dela por debaixo da mesa. Afinal, o lugar vai estar assim de piranha.
Outra solução seria você marcar reuniões importantes com executivas de outras empresas com uma semana de antecedência, para poder ficar esse tempo sem tomar banho e trocar de roupa. Ela precisa sentir nojo de você para nem pensar em se insinuar. O único clima que deve passar pela cabeça dela é o do cartaz do filme "Uma Verdade Inconveniente", com aquelas chaminés cuspindo poluição mortal. Você nunca sabe quando a reunião é uma armadilha, porque seu concorrente pode muito bem ter contratado uma profissional da sedução para levar você ao matadouro. Se bobear, seu posto de CEO irá para o vinagre, as ações de sua empresa despencam e — o que é pior — seu perfil no Facebook será bloqueado. Tudo por causa de uma ação de assédio sexual inventada por uma vítima profissional contratada.
Mas não pense que só existe o lado ruim dessa onda. Advogados já estão encomendando carro novo, e um bom empreendedor saberá detectar oportunidades de negócio num cenário assim. Eu já detectei. Assim que me aposentar vou lançar minha nova empresa cujo slogan será "Vai ter reunião com ela? #Me Too.". Vai ser uma espécie de Uber das reuniões corporativas, e o RH poderá me chamar pelo aplicativo sempre que um executivo for a uma reunião de negócios a sós com uma mulher. "Vai ter reunião com ela? #Me Too.". Tenho larga experiência e tudo planejado. Só falta eu decidir qual imagem colocar na logomarca. Estou na dúvida entre uma "vela" ou um "Corcel I" amarelo.
Mario Persona é palestrante de comunicação, marketing e desenvolvimento profissional. Seus serviços, livros, textos e entrevistas podem ser encontrados em www.mariopersona.com.br
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bom eu tive que vigiar irmã varias vezes mas os namorado sempre me pedia pra comprar algo pra eles ficar só. mas como eu ia e voltava mto rapido ele pedia pra comprar alguma coisa bem longe pra ver se demorava um pouco. assim eu ia pq tinha gorjeta kkk
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