Mas antes de jogar pingue-pongue virtual eu já tinha ingressado a contragosto no mundo das artes marciais, por insistência de minha mãe. Ela achava que pagar aulas de judô para eu apanhar de meninos maiores ajudaria na formação de meu caráter, e me inscreveu na mesma academia do coleguinha do grupo escolar que eu odiava e mais tarde viraria bandido.
Desisti do judô antes mesmo de pedir à minha mãe para costurar um zíper na blusa de meu quimono, a qual insistia em ficar aberta. Alguém sempre me derrubava antes de eu terminar de dar o nó na faixa branca. Mas não foi esse o motivo, e sim descobrir que os meninos de faixa mais colorida que a minha acabavam brigando na rua no velho estilo pugilista irlandês, com socos e pontapés.
Os meninos do campinho perto de casa também tiveram grande influência em minha vida esportiva, ou na falta dela. Até hoje sou grato por terem me convidado para jogar no time de futebol do bairro, tão logo ganhei de meu pai uma bola de capotão, toda de couro. Prestativos e cansados de jogar com bola de plástico ou de meia, os meninos iam até minha casa para avisar que o jogo iria começar e sempre me escalavam para jogar no gol. Atrás do goleiro.
Como eu era do tipo que vivia mergulhado nos pensamentos, aos onze anos decidi tentar natação. Aquilo rendeu as três únicas medalhas que ganhei honestamente. Além disso, nadar fez bem para minha autoestima. Para quem aos dois anos de idade se afogou no lava-pés da piscina do Grande Hotel São Pedro, o simples fato de não precisar ser ressuscitado cada vez que saía da água já era uma prova de superação.
A quarta medalha veio em um torneio de xadrez organizado por um primo com dificuldade para completar a grade de participantes. Como eu não sabia jogar, ele deu duas aulas com as quais aprendi que, no xadrez, o peão vai a pé porque não confia no cavalo, que vive dando guinadas. Estava pronto para competir. Meu primeiro adversário faltou, o segundo não veio, o terceiro ficou doente e o quarto... Bem, o quarto veio e ganhei dele.
Era um velhinho senil, íntimo da rainha, com quem conversava o jogo inteiro. Em voz alta, dizia a ela tudo o que pretendia fazer e o que eu faria em seguida. Fui seguindo suas instruções e venci, depois de escutar ele confidenciando à rainha como achava que eu poderia levá-lo a um xeque-mate. Minha sorte levou-me a disputar o terceiro lugar, quando finalmente fui derrotado. Como meu primo tinha comprado uma medalha a mais, fiquei em quarto lugar. Nem ouro, nem prata, nem bronze. Acho que era de lata.
Mas minha falta de jeito para esportes continuava nas quadras. No colegial meu professor foi rápido em detectar a posição em que eu seria mais útil para o time de basquete. Deve ter sido sua sensibilidade para identificar vocações que me levaria anos mais tarde a trabalhar num banco.
Se não fosse pelo incentivo e pela insistência de meus professores eu teria ficado longe dos esportes. Na faculdade teve até um que se recusou a aceitar o atestado médico que arranjei com uma colega para escapar das aulas de educação física. Ele não abriu mão de minha presença na quadra e ainda deu bronca em minha colega, filha de um conhecido ginecologista.
Esta crônica faz parte do livro "Crônicas para ler depois do fim do mundo", de Mario Persona
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